Interessante o que acontece em Honduras. No caminho inverso da comunidade internacional, internamente boa parte do povo e as próprias instituições democráticas apóiam o golpe militar. O mundo está preocupado com o vírus verde-oliva dos tempos da ditadura militar, mas a insatisfação dos hondurenhos com a corrupção, criminalidade, desemprego, pobreza, é o voto a favor da ação golpista e ditatorial. O povo prefere pão no lugar da democracia. Algo semelhante na Alemanha Oriental. Vinte anos depois da queda do muro de Berlim, uma pesquisa diz que 57% dos alemães orientais defendem o antigo regime comunista. “A vida lá era mais feliz e melhor do que hoje”, argumentam.
Não estamos muito longe disto aqui no Brasil. A corrupção política que não sai das manchetes faz a gente pensar que o melhor jeito seria um golpe de estado. Se fosse feita uma consulta popular, creio que muita gente votaria pelo fechamento do Senado e das Câmaras Legislativas. “Tempo bom era na ditadura militar” é a frase que se ouve. E não tem como pensar outra coisa. É a justa indignação com toda esta roubalheira. Mas é aí que mora o perigo, de querer matar o boi para acabar com os carrapatos.
Honduras, Alemanha Oriental, e esta idéia aqui de que “tempo bom era aquele”, lembra um episódio com o povo de Israel nos primeiros tempos do Antigo Testamento. Esta gente foi escrava do Egito por quatro séculos, e agora livre, mas nas agruras do deserto para a terra prometida, prefere a época da ditadura. “Pois é melhor ser escravo dos egípcios do que morrer aqui no deserto” (Êxodo 14.12), reclama para Moisés. Ao comparar este fato bíblico à situação política em nosso país, penso que estamos diante do “Mar Vermelho” e do tórrido “deserto”. A vara da democracia é o “cajado de Moisés” que abre o caminho da liberdade, e é nela que precisamos acreditar e nos mobilizar.
O apóstolo Paulo recorre ao tema “escravidão e liberdade” para falar de outro assunto, a ditadura espiritual. Ele condena o golpismo das regras religiosas na igreja da Galáxia e lembra: “Cristo nos libertou para que nós sejamos realmente livres. Por isso, continuem firmes como pessoas livres e não se tornem escravos novamente” (Gálatas 5.1). Este é outro risco nestes tempos de crise moral. É mais fácil viver dependente de regras ditatoriais e moralistas da religião, no lugar de seguir pelo caminho responsável da liberdade cristã. E se a corrupção política é um desvio, nesta questão espiritual o apóstolo tem um recado: “Não deixem que essa liberdade se torne uma desculpa para permitir que a natureza humana domine vocês. Pelo contrário, que o amor faça com que vocês sirvam uns aos outros” (Gálatas 5.13). No entanto, Paulo é taxativo: “No existe outro evangelho” (1.7).
“Outros evangelhos” em momentos de crise sempre foram uma saída mais cômoda. Mas depois vem a conta. Isto é um mau negócio na política e na religião.
Marcos Schmidt
pastor luterano
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