01/04/2010

Sexta - Feira Santa

Na Sexta-Feira Santa contemplamos a paixão e a morte de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. Suplicamos a Deus Espírito Santo que nos ilumine para entendermos corretamente a paixão e a morte de Cristo, para notar bem a causa de sua morte, que são nossos pecados, e a bênção de sua morte, que é a nossa salvação. Que o Espírito nos fortaleça e firme na fé e na vida santificada.
O texto, que nos serve de base, é do profeta Isaías 52.13 – 53.1-12. Ele o escreveu 800 anos antes do nascimento de Jesus. Isaías descreve o sofrimento de Jesus de forma tão impressionante que parece estar ele ao pé da cruz em meio à multidão, presenciando os acontecimentos.
Ao meditarmos sobre a paixão de Cristo, precisamos ter certos cuidados. Muitas vezes destacamos a ação dos líderes religiosos da época, do sumo sacerdote, dos fariseus e anciões do povo que condenaram Jesus, a ação de Pôncio Pilatos, seus soldados e do povo que gritou: Crucifica-o! Isto é importante, mas não acertamos o ponto se só olhamos para a ação dessas pessoas. Precisamos, sobre tudo, focalizar aquele que está atuando aqui, e este é Deus Pai com seu Filho Jesus Cristo que voluntariamente se submete à vontade do Pai. Pois, Jesus não foi uma vítima das circunstâncias ou do ódio das pessoas. Ele se entregou voluntariamente em obediência ao Pai, por amor à humanidade. Por isso precisamos manter que quem está agindo aqui e dirigindo tudo é Deus Pai. “Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo (2 Co 5.19).” Só então compreenderemos a verdadeira grandeza desses acontecimentos.
Isto nos leva de imediato à pergunta: Como é possível harmonizar aqui a fúria humana, toda a incompreensão, a inveja, o ciúme, o ódio e a crueldade com o amor de Deus? Será Deus o autor de tudo isto? Não, Deus não é o autor do pecado. Isto procede do diabo e de seus servos, as pessoas. Eles são responsáveis por suas ações e terão de responder por isso diante de Deus, como Judas por sua traição. A onisciência de Deus não é a causa do pecado. Mas Deus governa e usa tudo para um fim proveitoso. Também aqui precisamos dizer: “Todas as coisas cooperam para o bem dos que temem e amam a Deus” (Rm 8.28). Pois seus inimigos não puderam ir um milímetro além do que Deus lhes permitiu.
Por isso, a história da paixão mostra o profundo amor do santo e justo Deus para com a humanidade. Este amor que é “loucura” para a razão humana (1 Co 1.23). Nossa razão não o pode captar. O mistério é grande demais. Só podemos prostrar- nos em humilde adoração diante dos acontecimentos e suplicar que Deus nos firme na fé.
Mas vamos ao texto. O texto de Isaías é profundamente consolador. Conta-se que um fiel servo de Deus, ao agonizar com dores do câncer, pediu que colocassem um crucifixo na parede do seu quarto, de tal forma que pudesse vê-lo sempre. E disse: Isto é uma pregação completa que me consola, me enche de esperança e me dá força nos momentos de dor. Realmente assim é este texto do profeta Isaías. Ele nos coloca ao pé da cruz de Cristo.
Com brevidade, queremos analisar cinco pontos: 1) Quem é Servo sofredor? 2) Qual a grandeza do seu sofrimento? 3) Qual a profundidade de sua indizível paciência? 4) Qual a verdadeira causa do seu sofrer? 5) Qual o fruto do seu penoso trabalho?
1. Quem é o Servo sofredor? - O texto fala do sofrimento do “meu Servo”. Este Servo é Jesus, o eterno e unigênito Filho de Deus. Só ele foi capaz disso.
Alguns têm contestado esta afirmação de Isaías. Mas não tem como contestar. O próprio Jesus e os apóstolos confirmam ser esta uma profecia referente a Jesus (Jo 12.37,38; Lc 22.37; Mc 15.28; At 8.32-35; Mt 8.17).
Jesus não foi um sofredor como os malfeitores ao seu lado, dos quais se dizia: “Eles recebem o que seus atos merecem.” Jesus, o Servo sofredor, nunca fez injustiça alguma (v.9).
Jesus não foi um simples mártir que, não sendo compreendido, sofreu por uma causa justa, como muitos mártires cristãos.
Jesus também não foi um revolucionário social que queria reformar a sociedade do seu tempo e por isso foi odiado pelas autoridades eclesiásticas e civis.
Ele é, como Deus o afirma: “O meu servo” (v.4), o Filho amado de Deus, em quem Deus se apraz. Ele desceu voluntariamente à mais profunda miséria humana, por amor à humanidade. Por isso se afirma dele: “Olhamo-lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse” (v.2). O fato de Jesus ser o “Servo”, o eterno Filho de Deus, dá às suas dores e ao seu sofrimento um sentido bem especial, um valor eterno.
2. Qual a grandeza do seu sofrimento? – Toda a vida de Jesus, desde sua concepção até sua morte e sepultamento, foi um sofrimento.
Temos muitos sofrimentos no mundo. Há pessoas que sofrem desde o nascimento até sua morte, como por exemplo, os excepcionais. Ou pessoas que nascem em grande pobreza e vivem a vida em grande sofrimento até ao fim. Mas nada se compara ao sofrimento de Jesus, o Filho de Deus, que saiu de sua glória celestial e veio ao mundo, humilhou-se a ponto de ser concebido na virgem Maria, uma jovem piedosa, mas que tinham o pecado original e sua natureza pecaminosa. Quando o profeta afirma: “Nenhuma beleza havia que nos agradasse” (v.2). “Quando ele der a sua alma como oferta pelo pecado” (v.10). “Por juízo opressor foi arrebatado” (v.8), o profeta mostra que o sofrimento não foi somente em seu corpo, mas também em sua alma, como Jesus o afirma: “A minha alma está triste até a morte” (Mc 14.34). Ele tomou sobre si os pecados da humanidade e Deus Pai derramou sobre ele, nosso substituto, toda a ira divina. Por isso, ele exclamou na cruz: “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste”. Isto expressa sofrimento infernal que ele estava suportando. Não há no mundo sofredor que se possa igualar a ele. É zombaria alguém dizer: Sofro como Cristo.
3. Qual a profundidade de sua indizível paciência? – Dor e sofrimentos são algo horrível. Quando somos acometidos de dor surge em nós uma revolta. Há murmúrio. Há protestos. Há desespero. Mas de Jesus é dito: “Ele foi oprimido e humilhado, mas não abriu a boca; como cordeiro foi levado ao matadouro; e, como ovelha muda perante os seus tosquiadores, ele não abriu a boca” (Isaías 53.7 RA). Jesus foi de livre e expontânea vontade para o martírio e a cruz, por amor a ti e a mim. Ele sofreu calado e paciente. Só podemos contemplar e adorar com profunda gratidão.
4. Qual a verdadeira causa do seu sofrer. – Isaías afirma: “Certamente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si” (v.4). “Ele foi traspassado pelas nossas transgressões, e moído pelas nossas iniqüidades” (v.5). “Por causa da transgressão do meu povo foi ele ferido” (v.8).
A verdadeira causa do seu sofrimento foram os pecados da humanidade, os meus e os teus. Isto foge à nossa compreensão. Isto está oculto à razão humana. Ao pé da cruz vemos a grande santidade de Deus e a verdadeira gravidade do nosso pecado. O pecado é ofensa a Deus. E para poder ser perdoado, precisava ser pago. Por isso Deus afirma: “Ao Senhor agradou moe-lo” (v.10). Vejam aqui a atuação de Deus Pai. Ele o moeu. Pessoas perguntam muitas vezes: Por que este caminho? Não haveria outro? Não! A santidade de Deus exigia cumprimento da lei e pagamento pelos pecados, pois “sem derramamento de sangue, não há remissão” (Hebreus 9.22 RA). O Filho voluntariamente disse ao Pai: Eu vou. Deus age em profundo amor para com a humanidade. O profeta afirma: “O castigo que nos traz a paz estava sobre ele” (v.5).:“Pois Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo” (2 Co 5.19).
Assim o Cordeiro de Deus, Jesus, morreu voluntariamente pelos pecados da humanidade. Nem o Pai nem o Espírito Santo morreram pela humanidade, mas somente Jesus Cristo, que, como nosso irmão na carne, por uma única oferta, reconciliou a humanidade com Deus, como o afirma o escritor aos hebreus: “Porque, com uma única oferta, aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados” (Hebreus 10.14 RA).
5. Qual o fruto do seu penoso trabalho? - O profeta Isaías o destaca com grande precisão. “Pelas suas pisaduras fomos sarados” (v.5). “Ele verá o fruto do penoso trabalho de sua alma, e ficará satisfeito. O meu Servo, o justo, com o seu conhecimento, justificará a muitos” (v.11). “Por isso eu lhe darei muitos como a sua parte e com os poderosos repartirá ele o despojo” (v.12).
O fruto do seu penoso trabalho é a reconciliação da humanidade com Deus (Rm 5.11; 2 Co 5.19). Para expressar isto a Bíblia usa palavras como: expiar (Dn 9.24), propiciação (Jo 2.9), resgatar (Mt 20.28), salvar (Mc 10.41), remir (Tg 2.14). Há, agora, perdão para todos. Todos foram salvos, resgatados, redimidos (salvação objetiva). Só Deus foi capaz de realizar esta obra.
Esta salvação não é aplicada à humanidade automaticamente, mas oferecida, aplicada e selada por meios, a saber, pela palavra de Deus e os sacramentos. O apóstolo afirma: “Ele nos confiou a palavra da reconciliação” (2 Co 5.19). Por meio desta palavra o Espírito Santo chama, ilumina e congrega, conduz ao reconhecimento de nossos pecados e da culpa que pesa sobre todos nós. Mostra-nos o Salvador Jesus e opera a fé em todos os que não lhe resistem obstinadamente. A fé é a mão que recebe e se apega à graça de Cristo. Pela graça de Cristo somos declarados perdoados e justos. (Ap IV.72) (salvação subjetiva). Pela fé voltamos à comunhão com Deus para viver uma vida com Deus neste mundo e na eternidade.
Sublime amor de Deus em Cristo Jesus. Como agradecer a Deus por tamanho amor? Queremos louvá-lo e proclamar este amor de Cristo por palavras e obras. Amém.
Rev. Horst R. Kuchenbecker

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